A hecatombe neoliberal – Parte 2

José Maria Rabêlo

A situação é esta, como havia tratado no artigo anterior: o neoliberalismo está levando a Europa a uma nova crise, que, segundo os especialistas, poderá ser pior que a Grande Depressão dos anos 30.

Os números são catastróficos: a Espanha tem 25% de sua população economicamente ativa desempregada, índice que chega a 50% entre os mais jovens; a Grécia não faz por menos, são quase 20% sem trabalho e um caos político que ameaça a própria institucionalidade do país; a orgulhosa Inglaterra, que se imaginava à margem do desastre, vive o pior ciclo econômico dos últimos 100 anos; a Irlanda, apresentada durante longo tempo como exemplo bem sucedido das políticas neoliberais, amarga um período de retrocesso da economia, marcado por um desemprego de também 20% da população. Da Espanha à Letônia, como diz o Prêmio Nobel de Economia, Paul Krugman, a Europa sente-se invadida pelo fantasma da crise e da desesperança.

Em nível mundial, a estagnação já produziu uma perda de mais de 50 milhões de postos de trabalho, com relação aos que existiam antes de 2008. Até o fim do ano, segundo dados da OIT, Organização Internacional do Trabalho, serão 200 milhões de pessoas desempregadas.

A reação às políticas que levaram a esse quadro de ruina econômica manifesta-se por todo o continente.

Num reflexo da agitação que pulsa nas ruas de quase todas as capitais europeias, onze países viram cair seus governos comprometidos com o neoliberalismo (Espanha, Portugal, Bulgária, Finlândia, Hungria, Irlanda, Letônia, Lituânia, Eslovênia, Holanda e França) e outros, como a Inglaterra e a Alemanha, que sofreram pesadas derrotas eleitorais.

Diante da revolta popular, os governantes, pelo menos em palavras, começam a reconhecer que é preciso buscar outros caminhos, na contramão das medidas de austeridade, seguidas até aqui.

Não bastam essas palavras nem o choro pelo fracasso. Impõe-se uma mudança real e radical do modelo adotado nos últimos anos, baseado na valorização irracional do mercado e nos desprezo às questões sociais, que resultou na hecatombe que se desenha no horizonte.

Graças as suas últimas administrações, o Brasil está mostrando ao mundo que há alternativas às doutrinas neoliberais, que nos quiseram impingir como verdadeiras e definitivas. É hora de avançar, para que essas conquistas se consolidem.

Janela

O neoliberalismo levou o mundo ao pior desastre dos tempos modernos, uma hecatombe que ameaça levar à ruina vários países.

Neiva

O Brasil perdeu, na madrugada de 10 de maio, um grande combatente social. Neiva Moreira, jornalista, deputado e dirigente partidário, deixou-nos aos 94 anos, ao fim de uma extraordinária trajetória de luta e coerência política.

Nos anos anteriores ao golpe de 1964, participou de inúmeros movimentos populares, nacionalmente e em seu estado natal, o Maranhão, como o da defesa do petróleo (“O petróleo é nosso”) e pela criação da Petrobrás; a campanha das reformas de base do governo Goulart e a resistência à conspiração que levou à intervenção militar. No exílio, atuou decisivamente no esquema de divulgação e denúncia dos crimes da ditadura. Em 1979, juntamente com Brizola e outros companheiros, teve atuação destacada na organização do histórico Encontro de Lisboa, pela reconstituição do Trabalhismo. De volta do exílio, além de eleger-se deputado federal, com relevante desempenho, fundou Cadernos do 3º Mundo, fazendo da revista uma trincheira no combate ao neoliberalismo e à política de privatizações do governo de FHC. E assim foi em toda a sua vida.

A seu lado, tomei parte em vários daqueles momentos, inclusive quando fomos encarregados por Brizola de dar a forma final à chamada Carta de Lisboa, documento matricial do PDT.

Não é fácil escrever sobre Neiva em tão poucas linhas. Há uma expressão, entretanto, que resume toda sua irretocável biografia: foi um patriota que amou o Brasil e seu povo acima de tudo.

Será impossível esquecê-lo, especialmente pelos que o conheceram de perto. Em meu caso, num convívio de mais de 50 anos, que se interrompe agora pela inelutabilidade da morte.

Movimento “Ocuppy” e Geração 68

Brecht dizia que a gente deveria aprender a ver ao invés de olhar bobamente.

Paulo Cannabrava Filho*

Nos Estados Unidos, neste final de ano estão a ocorrer fatos que merecem uma reflexão que vem sendo eludida pela mídia dos poderosos. Os 99% estão saindo da toca e contestando o modelo, exigindo alternativas. Nestes tempos de TIC, além de aprender a ver, não basta aprender e saber falar. Há que aprender a comunicar.

Nesse país que foi vendido como modelo de democracia, desde 1953 não havia greve. Essa “paz laboral” foi construída a custa de muita repressão, massacres, terrorismo, macarthismo de um lado, e de outro, a custa da ilusão de uma sociedade de consumo sustentada por guerras e saques. Basta lembrar que duas datas importantes como 10 de maio e 8 de março homenageiam trabalhadores e trabalhadoras massacrados por lutarem por seus direitos.

Em setembro os primeiros a paralisar foram os trabalhadores no transporte na Califórnia. Os segundos, no final de novembro, foram os trabalhadores dos Correios, a última das estatais que sobrevive. Outro fato relevante: a população apoiando os grevistas.

Depois de mais de 50 anos de impor à população a imagem, ou o ideal de viver no melhor dos mundos, numa sociedade invejada, paradigma para os demais povos, essa sociedade está sendo sacudida por uma conjunção de gerações que se manifesta contestando o sistema. Não falta na mídia global quem esteja fazendo comparações com a geração de 1968. Vale, portanto, uma reflexão, comparando os dois fatos históricos.

Lá, a geração 68 queria o fim da guerra de agressão contra o Vietnam. Queria também e talvez principalmente, livrar-se das amarras da anacrônica moral fundamentalista. E uma coisa tinha a ver com a outra uma vez que essa moral induzia a obediência a serviço de uma nova cruzada santificadora contra o comunismo pagão.

O lema “fazer o amor e não a guerra” e a rebeldia manifestada na nudez em acampamentos em que se praticava amor livre, maconha e LSD, foi a máxima contestação a uma moral medieval incompatível com o nível de desenvolvimento alcançado pelo país. Tudo pacifica e condescendentemente. Tudo muito diferente do que ocorreu nos trópicos, na mesma época e o que está a ocorrer agora com os movimentos “ocupem” (ocuppy).

O Brasil viveu o revês dessa moeda. As gerações que fizeram 68 – a minha era a do meio – queriam mudar o mundo, queriam ser protagonistas de uma revolução transformadora, revolucionária, cultural, socialista. Basta lembrar o clima em que se forjou uma escola nova, uma história nova, a bossa nova, o teatro e o cinema novo.

Aqui, estudante, operários, camponeses, soldados e intelectuais pareciam dispostos ou prestes a tomar o palácio de inverno. Veio-nos em cima a contrarrevolução financiada e comandada pela direita global.

A ciranda não para de rodar. 2011 com suas “ocupações” soa como prenúncio de que alguma coisa pode acontecer em 2012 na sede imperial com repercussão em todo o mundo.

Nos últimos 50 anos ninguém se preocupou com a massa de excluídos a ocupar as periferias das cidades e continuaram a viver a ilusão de estar em um mundo perfeito. Conquistas sociais centenárias foram pisoteadas em favor de uma minoria cuja ganância não tem limites.

O movimento “ocuppy” – ocupe Wall Street, ocupe Massachusets ou ocupe Califórnia ou Nova Orleans – parte da constatação de que “os 99% somo nós”. Os “indignados” nos EUA ocupam as praças e saem às ruas em apoio aos grevistas portando cartazes contra a repressão e o desemprego e gritando “abaixo o capitalismo”. Capitalismo bem simbolizado em Wall Street, comando do cassino financeiro global. Pela primeira vez, parafraseando Marti, no coração do monstro se estão identificando suas entranhas, e pedem intervenção na ciranda financeira. Rapidamente, na Europa em crise, capitaneada pela juventude, três gerações ocupam as ruas contaminadas de indignação.

Para a mídia global a rua foi ocupada por “transgressores” e trata de apavorar a classe média com o uso e abuso do diversionismo, utilizando as palavras já destituídas de seu significado como extremistas, esquerda, contraventores que querem o fim do tão querido way-of-life, e assim justificam a violência com que estão reprimindo essas manifestações. A repressão começou em setembro, violenta, como a que se viu em Oakland, Los Angeles, Washington, Nova Orleans ou Nova York.

Os manifestantes de 68 queriam gerar uma contracultura. Os atuais também, mesmo porque muitos deles estiveram em Woodstock, e por isso mesmo gritam mais alto e vão fundo na identificação da crise: é o próprio sistema que eles ajudaram a construir. E a eles se juntam os excluídos, aqueles que como os moradores de nossas periferias ou de nossos morros querem um lugar ao sol. Lá e aqui eles querem igualdade, querem trabalho. Lá eles gritam ou acenam cartazes mostrando o que querem:

“Qual a solução? – Revolução!”
“Contra a supremacia branca”
“Contra a polícia e o estado policial”
“Gente antes do dólar”
“Abaixo o capitalismo”
“As pessoas brancas se sentem livres, os negros não”, declarou um rapaz vindo da periferia de Boston receoso de juntar-se aos manifestantes. Tudo isso que está acontecendo pode ser visto no youtube e nos blogues dos indignados. E impressiona ver velhos e moços, bancas e negras, dançando a mesma música. A mídia global, ao ignorar esses fatos ou depreciá-los, já não consegue se impor. Isso é muito importante. Os meios alternativos estão se tornando os únicos meios de informação crível. E isso é mais do que importante.

Isso que se vê na blogosfera por si só não basta. É preciso que haja uma estratégia de poder alternativo e para isso é preciso que haja partidos alternativos com planos nacionais de desenvolvimento que leve a construção de sociedades de outro tipo. Sociedades humanizadas. Para isso é necessários abandonar os velhos e construir novos paradigmas. O grande desafio para se poder trilhar esses novos rumos é o de devolver a humanidade aos habitantes deste planeta.

A direita é global

Se não nos deixam sonhar
Não os deixaremos dormir
(anônimo)

Paulo Cannabrava Filho*

As TIC, maravilhas e desafios deste novo século, paralelamente à volatilização do capital financeiro favoreceu a globalização da direita. Direita entendida como protagonista e/ou favorecida ou levada pela corrente. Ideológica ou alienada, oportunista ou utilizada, não importa, tem organização, direção e rumo, seja nos âmbitos locais, nacionais, regionais ou global.

A alternativa a essa realidade poderia ser uma esquerda global? Esquerda entendida como protagonista da construção de alternativas ao que a direita impõe como modelo parece estar longe disso. Esquerda ideológica, consciente de que esse modelo leva ao cataclismo, tampouco.

Marx, Lênin, Trotski e outros que protagonizaram as Internacionais (da 1a à 4a) entendiam que era necessário buscar uma confluência nos pensamentos e uma unidade na ação para enfrentar o capitalismo não tão globalizado da época, mas já com uma estratégia imperialista bem definida para assumir o controle. Com tantos e brilhantes pensadores e líderes, os paradigmas formulados para construir um mundo alternativo, melhor, não duraram cem anos.

Aqui, na nossa América, essas utopias sequer chegaram a amadurecer como alternativas. Difícil. A própria esquerda que se desenvolveu entre nós, que se vê, nasceu no autoritarismo, cresceu no individualismo consumista, foi formada para servir de contraponto necessário para manter a aparência de democracia à hegemonia oligárquica.

De maneira geral, assim se teoriza, a esquerda não foi formada para disputar o poder e ser alternativa ao sistema. Com raras exceções, essa esquerda não pensou o país. Preferiu seguir cartilhas e deu com os burros n’água.

Aqueles que ousaram pensar o país, emancipar o povo, foram demonizados e não fazem parte da historiografia oficial. O pouco que conseguiram construir em parcos períodos de revolução ou de progressismo ou de democracia, foi e tem sido violentado por contrarrevoluções ou ações desestabilizadoras promovidas pela direita global.

A decadência da escola pública entre nós, por exemplo, faz parte do projeto de prolongação da vida dessa direita global, assim como a cooptação de intelectuais. A escola perde a visão crítica da realidade e a universidade deixa de ser laboratório para pensar o país.

Nossos centros de ensino formam servos intelectuais capacitados para servir ao sistema. Servir e ser vil, o que dá na mesma.

Nesse vazio a direita impõe seus conceitos. Democracia perde o sentido de demos para auto ou pluto e os servos intelectuais teorizam para que assim seja. Se não é como desejam os senhores das armas não é democracia.

O próprio sentido do ser de esquerda perde seu conteúdo original. Basta atrapalhar minimamente o projeto hegemônico entram em cena os cientistas, ou os guerreiros da semiologia. Esquerdista é logo identificado como terrorista e este como ameaça mundial ao bem estar global. Um jogo perverso, perigoso, vitimando os desavisados.

Nesta guerra cibernética ou ciberguerra que vem sendo travada para ampliar o controle da direita global, as bombas são lógicas e semiológicas. Seus estrategistas sabem onde pegar e como pegar.

O diário La Jornada, no México, é uma ilha ética num oceano de indignidade midiática. Janela aberta a intelectuais livres, o jornal e seus trabalhadores vêm resistindo heroicamente numa conjuntura das mais difíceis do processo histórico mexicano. México, que já vinha de mal a pior, com a adesão ao tratado de livre comércio com os EUA mergulha numa ausência quase total de perspectivas de desenvolvimento. O que se vê é vazio de poder econômico, vazio de poder político, desemprego rural e urbano, aumento das empresas estadunidenses e a presença de seus agentes, paralelamente ao crescimento do narcotráfico. “En México se perdió el control”, expressou com estrema objetividade Carmen Lira, diretora do La Jornada, para definir a atual conjuntura.

O narcotráfico convive com o terrorismo, que por sua vez convive com os agentes dos serviços de inteligência imperiais: CIA, SNA, Mossad e “tutti capi mafiosi”. Nesse clima, o narcoterrorismo torna-se o grande medo da população, induzida pela mídia global.

Para eles La Jornada esta se tornando inconveniente. É hora de utilizar as bombas semióticas. “Jornada é conivente com o terrorismo do ETA”. O que sobressai é “terrorismo”. Terroristas são os zapatistas, são os comunistas, os talebans e o narcotráfico. Está feita a confusão semiológica.

Dizer que isso não afeta a credibilidade e a circulação do jornal seria ingenuidade. Afeta e estão sentindo no dia-a-dia. Como não existe uma esquerda global organizada, cabe a cada um dos democratas sinceros, a cada uma das organizações sociais de caráter popular defender La Jornada.

Em nome da liberdade de expressão a mídia dos poderosos pode plantar calúnias, dizer o que bem entende e não dar espaço para que os difamados se defendam. As redes sociais estão aí para dar as respostas necessárias.

 

Inclusão digital

Paulo Cannabrava Filho

O tema da inclusão digital, tão em moda entre governos e sociedade civil, não apenas em nossa América, mas em grande parte do planeta, por trazer riscos e oportunidades, talvez mais riscos que oportunidades, merece uma reflexão.

O primeiro ponto a ser considerado é a profunda diferença entre ter acesso aos meios e a utilização que se faça deles.

No Brasil, por exemplo, a mídia – definida aqui como os grandes meios de comunicação de massa – se jacta de que o país atingiu a cifra de 200 milhões de celulares. Praticamente mais de um por habitante. Uma enquete realizada por Mario Brandão constatou que dois terços das pessoas que têm celulares não os usaram nos últimos seis meses. Acontece que a maioria desses aparelhos são pré-pagos, e como as pessoas não têm dinheiro para pôr créditos não fazem chamadas, embora as recebam.

Nos países de nossa América a discussão sobre o direito ao acesso se dá no marco geral da democratização da comunicação, tema envolvido em grande controvérsia, uma vez que se entende, a priori, que para tornar os meios democráticos é preciso haver sobre eles um controle social. Assim, à simples menção de que é necessário democratizar a comunicação, os meios vociferam contra os “demônios estatizantes” que querem os meios “sob censura para impor suas ideias”.

A propriedade desses meios tradicionais de comunicação de massa está cada vez mais concentrada em poucas mãos, seja de famílias ou de grandes corporações. Utilizam-se da semiótica, dos símbolos que são caros à nossa cultura, principalmente para os setores mal formados e mal informados da classe media.

Esses pressupostos, presentes também na classe política, amplia as controvérsias por confundir ainda mais as pessoas com o emprego equivocado dos vernáculos. Aproveitam-se das confusões axiológicas criadas em torno de palavras como democracia, voto, socialismo, comunismo, liberdade e também de questões éticas para gerar confusão nas mentes pouco avisadas.

No Congresso brasileiro há projetos cujo objetivo é a universalização do acesso. Parlamentares e executivos federais e estaduais prometem em seus discursos um computador para cada aluno nas escolas de ensino fundamental. Para uma melhor compreensão da controvérsia, no próprio Congresso há outro projeto que pretende que todo usuário da web seja fichado, com todos os dados de sua identidade.

Até agora, o acesso à web se dá majoritariamente em locais públicos, as chamadas “lan houses”. O usuário paga por hora de utilização sem que haja qualquer tipo de controle. Existem 109 mil “lan houses” em todo o país, contra 2.500 salas de cinema e 2.600 livrarias.

Há pontos de acesso em algumas escolas de alunos até 16 anos, nos locais de trabalho e, por último, nas residências.
Durante o governo de Lula, através do Ministério da Cultura, dirigido por Gilberto Gil, e em seguida por Juca de Oliveira, houve um grande esforço pela inclusão digital, através de projetos de implantação de Pontos de Cultura, Pontos de Mídia Livre e implantação de bibliotecas públicas nos municípios (partiram de praticamente nenhuma para cinco mil). Avançou-se bastante com esses projetos, mas com a mudança de governo, os recursos desapareceram e com isso o entusiasmo inicial.

No que mais se avançou no Brasil foi na área do governo eletrônico – e-gov -. Não digo que se exerça um controle social dos manejos do governo federal, mas se poderia fazer. Toda a gestão financeira e orçamentária do governo está disponível no SIAFI (Sistema Integrado de Administração Financeira) Os municípios manejam suas contas através do Siconv (Sistema de Convênios) que é um braço do Siafi. Os projetos de qualquer natureza executados por terceiros com dinheiro público têm que utilizar as planilhas dispostas por e no sítio do Siconv.

Os bancos brasileiros exportam tecnologia de automação. Hoje em dia raramente se precisa ir a uma agência bancária, pois é possível pagar todas as contas e tributos pela internet, inclusive através de um telefone celular.
Há uma rede virtual dirigida a professores que ensina a tecnologia social – Educaraprender. O Serviço Social da Indústria – uma instituição privada que maneja recursos públicos – oferece prêmios para estimular o desenvolvimento de programas (softwares) para comunicação comunitária. Isso é bom, pois temos que nos liberar da dependência das redes sociais centradas nos EUA.

Com tudo isso pareceria que estamos no caminho de uma solução integral para a inclusão digital. Na verdade, a apropriação das tecnologias da informação está promovendo mudanças no conceito de democracia e participação. O que existe é ainda incipiente, mas é incomensurável o seu potencial. O que é que falta?
Eu diria que faltam políticas que definam o que se pretende com inclusão coletiva e estratégias que levem a objetivos de curto, médio e longo prazo.

Como criar e fortalecer redes de cooperação?

Como conectar as pessoas e criar um sentimento de comunidade?

Como desenvolver o conceito de cidadania?

Como utilizar as redes para a aprendizagem coletiva e permanente? (ao longo de toda a vida)

Como evitar que a utilização das redes se torne uma doença?

O caráter democrático, anárquico mesmo, que torna fascinante a rede mundial para todas as pessoas, apresenta também alguns riscos. O principal é a sua apropriação pelas grandes corporações. Nesse sentido, eles já estão utilizando-a para demonizar líderes populares inconvenientes para o sistema; para fazer propaganda política enganosa; para estimular o consumismo. Já vemos um excesso de anúncios até nas redes. Secundariamente, há riscos que preocupam as famílias, como o voyeurismo, a pedofilia, o roubo.

Eu apontaria outro risco que é o de intoxicação por excesso de informação. É preciso cuidar-se, pois isso pode conturbar-nos a mente, torná-la dispersiva, debilitar a capacidade de concentração.

O papel apropriado para as redes sociais e para os portais especializados é o de filtrar o conteúdo disperso e apresentá-lo de maneira organizada. Existe uma grande quantidade de portais especializados em praticamente todas as ciências e atividades humanas.

O mais fantástico na era da convergência é que se coloca na mão de cada um imensurável poder multimídia. Um aprendizado mínimo de programas gráficos e de comunicação dá às pessoas a possibilidade de colocar o que quiser de sua criação para que seja visto na rede.

Agregue-se o inegável poder de mobilização das redes sociais. Na Europa e nos EUA estão servindo para estimular as novas gerações a se mobilizar para mostrar seu descontentamento com a crise do sistema. Na África Mediterrânea serviu para mobilizar setores favoráveis à submissão aos interesses euro-estadunidenses.

O que preocupa é a questão do conteúdo e para quem serve essa mobilização e esse conteúdo. Não se pode esquecer que assim como foram utilizadas as ondas do rádio e a televisão para fazer diversionismo, também se estão utilizando a web e as redes sociais para fins políticos.

Nos setores mais politizados e engajados na luta pelo desenvolvimento integrado e por uma sociedade mais justa há certo consenso de que deve haver uma regulamentação, não apenas dos meios de comunicação, mas de tudo o que conforma o sistema comunicacional. Se não houver uma política nacional de comunicação e universalização do acesso, tudo fica ao arbítrio da indústria e dos prestadores de serviço de comunicação, ambos sujeitos aos interesses do capital financeiro.

A Unesco propicia a implantação de Sistemas Nacionais de Informação e sua integração regional. Dentro desse conceito criou-se nos anos 1970 a ASIN – Ação de Sistemas Nacionais de Informação – que quase deu resultado, mas por pouco tempo. Impôs-se a vontade dos mais fortes, mas esse é um conceito de extrema atualidade que deve ser retomado. Paralelamente, em 1973, foi criado o pool de agencias dos países Não Alinhados, outra iniciativa torpedeada antes de se consolidar.

Essa ideia foi retomada em fins de 2010 em Buenos Aires num encontro de diretores de agências de notícias oficiais, até que, em junho de 2011, nasceu, em Caracas, a ULAN – União Latino-americana de Agências de Notícias -. Em novembro de 2011 tinha como Integrantes: ABI da Bolivia; AGN da Guatemala; Andes do Ecuador; AVN da Venezuela; EBC do Brasil; IP do Paraguai; Notimex de México; Telan da Argentina e Prensa Latina de Cuba.

O objetivo continua sendo o proposto por ASIN, o de dispor de um canal alternativo às grandes agências de noticias imperiais e à própria mídia tradicional, poder informar o que esses veículos desprezam mas que são de importância para nosso desenvolvimento. Não obstante falta ao novo projeto uma definição mais ampla dos objetivos de integração entre as associadas. Elas estão apenas colocadas individualmente em um portal.. Seus estatutos indicam ser um espaço coletivo, uma rede de intercâmbio informacional com intenção de compartilhar experiências e formar profissionais.

Cabe fazer um parêntesis para recordar que o governo brasileiro, na época sob uma ditadura cívico-militar, foi um dos que mais combateram a ideia de ASIN, talvez por não desejar mesclar-se com governos democráticos e progressistas que a propiciavam. É somente em 2008 que o governo decide criar a Empresa Brasil de Comunicação – EBC – que integra a Agência Brasil; TV Brasil; TV Brasil Internacional; Radioagencia Nacional y diversas bandas de Radio Nacional transmitiendo de Brasilia, Rio de Janeiro; Amazonia.

Veja-se este exemplo. No Brasil há um denominado Plano Nacional de Banda Larga destinado a garantir o meio físico (fibra ótica, satélite etc.) para o acesso universal. Não é preciso ser especialista para constatar que o plano estancou. Porém, Mario Brandão denuncia que el PNBL privatiza o processo, coloca nas mãos de grupos que querem “universalizar os meios” que é o mesmo que dizer universalizar a venda de seus produtos e não o acesso.

Desde a II Guerra Mundial a ciência da informação passou a ser o foco dos maiores investimentos em pesquisa e desenvolvimento e a maior concentração desses recursos se desenvolvem nos EUA. Eles assumiram a vanguarda na articulação da infra-estrutura global de informação na era da convergência. Europa ficou à deriva e com intenção de recuperar o tempo perdido abriu as portas à privatização. Privataria, dizemos, para definir o que mais parece aventuras de piratas.

O pior das TIC, sem dúvida, tem sido sua utilização para o desenvolvimento do cassino global. A grande roda financeira virtual, que volatilizou as moedas e pôs grande parte da humanidade sob a ditadura do capital financeiro e volátil. Como se livrar disso é o grande desafio da era atual.

Há um entendimento de que contra o global vale antepor o local.

As redes sociais permitem a formação de comunidades virtuais em que cada pessoa tem a liberdade de utilizar sua capacidade multimídia. Essas comunidades podem ser fechadas ou abertas; uma comunicação entre amigos ou entre profissionais, ou entre pesquisadores. As comunidades entre cientistas e acadêmicos têm propiciado um grande intercâmbio de experiências e conhecimento.

Nossos conselheiros, Ladislau Dowbor e Theotonio dos Santos defendem que o intercâmbio de conhecimento entre cientistas favorece o processo de re-criação e ampliação do conhecimento. Fiéis a esse conceito colocam em seus portais tanto suas produções acadêmicas como as obras que realizam para publicar em livros.

Algumas das ferramentas mais utilizadas pelo público em geral são: Facebook, orkut, myspace, twitter, linkedin y flick (profissionais), ning, wordpress. O Facebook foi criado por um brasileiro. Ajuda a encontrar e manter amigos estejam onde estiverem. Cresceu tanto que se tornou irresistível para as grandes corporações. Grandes fotógrafos em todo o mundo utilizam o flick. A tecnologia oferecida por wordpress talvez seja a mais utilizada individualmente, por professores e jornalistas em seus blogs.

Totalmente voltada ao consumo é a computação em nuvem (cloud) lançada por Steve Jobs pouco antes de seu desaparecimento. Um incrível backbonne armazena as músicas, as fotografias, as agendas e outros arquivos dos usuários de Mac e seus derivados. Claro que se tem que pagar por cada música ou filme baixado. No rasto de Jobs o Conselho de Segurança Nacional, por ordem de Obama, está concentrando seus esforços para utilização da computação em nuvem para efeito e guerra cibernética e segurança.

A comunidade acadêmica e as redes sociais estão cada vez mais se apropriando de tecnologias computacionais abertas, os chamados softwares livres, e isso é fundamental para quem pretende se livrar do domínio e controle das mega corporações.

Utilizando a tecnologia ning os jornalistas no Brasil criaram o Portal do Autor, um espaço de criação coletiva de prestação de serviço para trabalhadores em comunicação social. O foco principal é a questão autoral, mas o portal oferece espaço para que os profissionais coloquem suas criações, sejam textos, fotos, vídeos. Ali podem ser integrados grupos de interesses específicos, participar de fóruns temáticos de discussão. Há um amplo espaço sobre legislação e jurisprudência sobre direitos.

O uso das redes requer um aprendizado constante, sem fim, pois há que acompanhar a evolução das tecnologias e procurar novas finalidades para sua utilização.